quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Deusas do cotidiano


Deusas do cotidiano
Donas da insustentável leveza do ser, as infantes guerreiras enfrentam a lei da gravidade. Permanecem de pé ante aos dragões comedores de sonhos que escondem na gravidade da lei. Das trincheiras do ninho enfrentam moinhos de mós afiadas para protegerem a pança dos pequeninos

Sérgio Vaz

“De todos os hinos entoados em louvor às revoluções nos campos de batalhas, nenhum, por mais belo que seja, tem a força das canções de ninar cantada no colo das mães”

O nome dessas mulheres eu não sei, não lembro e nem preciso saber. São nomes comuns, em meio a tantos outros espalhados por esse chão duro chamado Brasil.

Mas a maioria delas eu conheço bem, são donas de um mesmo destino: as miseráveis que roubam remédios para aliviar as angústias dos filhos. É quando a pobreza não é dor, é angústia também. São as ladras de Victor Hugo.

Donas da insustentável leveza do ser, as infantes guerreiras enfrentam a lei da gravidade. Permanecem de pé ante aos dragões comedores de sonhos que escondem na gravidade da lei. Das trincheiras do ninho enfrentam moinhos de mós afiadas para protegerem a pança dos pequeninos. São as Quixotes de Miguel de Cervantes.

Místicas, não raro, estão sempre nuas em sentimentos. Quando precisam, cruas, esmolam com o corpo, e se postam à espera do punhal do prazer que cravam no seu ventre.

É quando o prazer humilha. São as habitantes do inferno de Dante. Rainhas de castelos de madeiras, sustentam os filhos como príncipes, e os protegem da fome, do frio, e da vida dura e cruel que insiste em bater na porta das mulheres de panela vazia.Quanto aos reis, também são os mesmos: os covardes dos vinhos da ira.

Mágicas, esses anjos se transformam em rochas, quando a vida pede grão de areia.

Em flores quando rastejam e espinhos quando protegem.

Essas mulheres são aquelas que limpam tapetes, mas não admitem serem pisadas.

São domésticas, mas não admitem serem domesticadas.

Sim, são as deusas do dia a dia.
(10/03/2009)

Le Monde Diplomatique

4 comentários:

Austri Junior disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Austri Junior disse...

Belo texto!
Essas mulheres são mulheres de verdade.

Unknown disse...

Que lindo, Eduardo!

Essas mulheres, não são "amélias". conheço muitas e a maioria sofre mas emprendedoras que são tem apenas um meio diferente de alimentar os filhos.

Boas festas!

Beijos

Mirse

Gerardo Cailloma disse...

Es una belleza, pero debemos luchar para que estas mujeres maltratadas por la indifencia tengan una vida mejor. Muchas mujeres anónimas en la sierra del Perú o las ciudades grandes llevan adelante sus vidas y las de sus hijos. La educación es una arma que las ayudaría a ser mejores. Pero a muchos nos les interesa que eso sucede para poder tener a tanto ser humano sometido.